Caso inusitado levanta debate sobre os limites legais da licença-maternidade no Brasil
Em um episódio que tem gerado discussões nas redes sociais e entre especialistas em direito trabalhista, uma recepcionista de Salvador entrou na Justiça após ter seu pedido de licença-maternidade negado para cuidar de uma boneca reborn, conforme noticiado pela CNN Brasil. No processo, ela solicitou 120 dias de afastamento, além do salário-família, alegando que a boneca, batizada de Olívia, representa uma filha sob todos os aspectos emocionais.
A ação foi protocolada na Justiça do Trabalho da Bahia, com valor estimado em R$ 40 mil. A profissional, contratada desde abril de 2020 em regime de jornada parcial, recebe salário mínimo. Na petição, a defesa sustenta que a recusa do benefício causou abalo psicológico, por entender que houve uma deslegitimação de sua condição de “mãe”. Segundo ela, os cuidados e o vínculo afetivo com Olívia são equivalentes aos de uma maternidade biológica.
A trabalhadora afirma ainda ter sido alvo de chacotas por parte da gestão e de colegas após comunicar sua condição de mãe da boneca. Relata que, em tom de deboche, representantes da empresa chegaram a dizer que ela “precisava de um psiquiatra, não de um benefício trabalhista”.
O pedido foi indeferido pela empresa, sob a justificativa de que a legislação vigente não contempla situações envolvendo objetos inanimados, mesmo que representem figuras humanas.
Diante da situação, a recepcionista pediu a rescisão indireta do contrato de trabalho, além do pagamento das verbas rescisórias devidas. Também requer uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil.
O caso, embora singular, reacende o debate sobre os critérios para concessão de licença-maternidade no Brasil. A legislação atual assegura o direito à licença-maternidade para mães biológicas, adotantes e, em determinadas situações, para mães não gestantes em uniões homoafetivas.
Especialistas apontam que, embora o vínculo afetivo com objetos como os bebês reborn possa ser significativo para algumas pessoas, a legislação trabalhista não reconhece tais relações como fundamento para concessão de benefícios destinados à maternidade real. “A licença-maternidade é um direito previsto para proteger a saúde da mãe e do filho, garantindo tempo para recuperação do parto e estabelecimento do vínculo com a criança. Estender esse direito a situações que não envolvem uma criança real poderia desvirtuar o propósito da norma”, afirma a advogada trabalhista Mariana Souza.
O processo ainda está em tramitação, e a decisão judicial poderá estabelecer precedentes sobre os limites da interpretação da legislação trabalhista frente a novas formas de relações afetivas.
Enquanto isso, o caso continua a gerar debates sobre os contornos legais da maternidade e os direitos associados a ela.
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